O IMPÉRIO MATARAZZO: Dilemas entre o Patrimônio e o Progresso na cidade de São Paulo


ARTIGO CIENTÍFICO

O IMPÉRIO MATARAZZO: Dilemas entre o Patrimônio e o Progresso na cidade de São Paulo
Larissa Simões Azevedo
Wanderlainy dos Anjos
Leandro Ortunes


A importância deste texto, se dá pela reflexão de um modelo de cidade que consiga dialogar com seu passado, valorizando seu patrimônio e ressignificando novas dimensões da cidade. No Brasil, é senso comum, o desprezo em relação ao patrimônio histórico, principalmente o arquitetônico. Como prova disso, demonstraremos por meio do caso Matarazzo, a história de desenvolvimento do Brasil industrial que poderá ser ofuscada diante do novo modelo desenvolvimentista do século XXI.

Para o estudo e ensino da arquitetura, é preciso levar em conta, os múltiplos sentidos do conceito de urbanismo e produzir novos textos mais aprofundados que subsidiem novas intervenções urbanas levando em conta a dimensão histórica das cidades:

Por esses motivos, por urbanismo se entende também textos que acompanham e atravessam as diversas formas do projeto de cidade e do território: descrevem, ilustram, demonstram, argumentam, sugerem e solicitam os imaginários coletivos e individuais. (SECCHI, 2016, p.187).

BIOGRAFIA DE MATARAZZO

Francesco Matarazzo foi o nome que iria influenciar a história da indústria brasileira em vários sentidos, mas acreditamos que nem ele mesmo imaginava que uma simples produção de banha de porco conseguiria torná-lo um homem extremamente rico e poderoso para época.

No ano de 1881[1] desembarcava no Brasil vindo da Itália o jovem Matarazzo, com nada em suas mãos, apenas uns “trocados” no bolso, pois suas malas e produtos trazidos da Itália afundaram em um acidente no momento do desembarque. Sozinho procurou seu amigo Fernando Gradim Que vivia em Sorocaba, para ajudar com algum emprego, nisso começou a vender linguiça entre as ruas das cidades, que por coincidência seu colega de trabalho passou a ser Antônio Pereira Ignácio que foi um dos fundadores do Grupo Votoranti.

Francesco com muito esforço e com poucos meses de trabalho decidiu abrir sua própria mercearia, que vendia um pouco de cada produto, e por incrível que pareça, o que mais vendia era banha de porco, que era produzida em outras regiões do país, e percebendo que este produto era mais rentável, começou a fabricar banho de porco no fundo da mercearia. O produto era feito com um simples caldeirão para derreter a banha, com isso barateou o produto e assim comprou quase todos os porcos da vizinhança, logo começou a enlatar o que permitiu que as vendas crescessem ainda mais.

Ao expandir seus negócios, em 1890 conseguiu um empréstimo e construiu o moinho Matarazzo em São Paulo. Uma vez que seu empreendimento resultou lucro, construiu o complexo industrial da Água Branca inaugurado em 1920, também em São Paulo. Com 100 mil metros quadrados, o complexo possuía de serraria, refinaria, destilaria, frigorífico, fábrica de carroças, sabões, perfumes, adubos, inseticidas, velas, pregos, armazéns, banco, distribuidora de filmes, fábrica de licores e suas usinas, daí surge o lema “Fé-Honra-Trabalho”.


Figura 1: Logo das Indústrias Matarazzo 


[1] Disponível em http://seuhistory.com/hoje-na-historia/morre-francesco-matarazzo-um-dos-maiores-industriais-da-historia-brasileira.

Para suprir a demanda por seus produtos, Matarazzo investiu em sua própria logística e conquistou um terminal exclusivo no porto de Santos, duas locomotivas e navios, seu império com 365 fábricas empregou milhares de pessoas e influenciou a economia tornando o estado mais rico do país. Chegou a ser a 5ª maior fortuna do mundo e o italiano mais rico fora da Itália com um patrimônio em 20 milhões de dólares.

Em 10 de Fevereiro de 1937, Matarazzo faleceu após sentir-se mal em uma de suas visitas às fábricas, deixando sua grande fortuna para seus doze filhos.

A MANSÃO


Um dos grandes marcos arquitetônicos do império Matarazzo, foi sem dúvida, sua mansão. Situada na Avenida Paulista de esquina com rua Pamplona, numero 1230, neste terreno de 11.952,50 m² foi construído a mansão dos Matarazzo. Foi projetado por dois arquitetos italianos,Giulio Saltini e Luigi Mancini. A mansão possuía dezenove quartos e dezesseis salas, além de sauna, jardim e outras áreas. Na sua fachada havia no frontão uma escultura do brasão da família.A mansão começou a ser construída em 1896 e foi concluída em 1920, no auge do sucesso profissional de Matarazzo.Com decorrer dos anos e com a queda do império Matarazzo, a mansão deixou de ser habitada pela família nos anos 70, fato que a deixou deteriorada.

Como esta mansão era um marco importante tanto para história da família Matarazzo quanto para história de São Paulo, em 1970 foi solicitado o tombamento do imóvel, pois ainda existia uma parte que poderia ser preservada. Essa medida, entrou em acordo não somente como um tombamento histórico, mas também como preservação da criação humana por meio da arquitetura: “Trazendo a memória afetiva a dimensão sagrada das obras humanas, o monumento histórico adquire, além disso, uma universalidade sem precedentes” (CHOAY, 2006, p.141). Neste sentido, a mansão Matarazzo, poderia assumir aspectos múltiplos para cidade e seus cidadãos.

Enquanto se decidia qual seria o futuro da casa e do terreno da família Matarazzo, a estrutura da mansão começou a ruir, sob a suspeita de que as colunas teriam sido danificadas criminalmente[2]. Em 1990 a estrutura desmoronou.Então o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico cancelou o pedido de tombamento que estava em andamento. Como não haveria nada o que salvar, os remanescentes da mansão foram demolidos em 1996.

[02] Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0905200821.htm

[Figura 2] Mansão dos Matarazzo 

AS FÁBRICAS

As fábricas Matarazzo, assim como boa parte das fábricas construídas neste período, seguiram o modelo inglês de construção, baseado em estrutura metálica e tijolos de barro. No século XIX, a Inglaterra influenciou o contexto urbano no Brasil, por meio de seu estilo arquitetônico para fábricas e estações de trens. Com o colapso de suas atividades, diversas fábricas ficaram abandonadas, outras foram leiloadas e cederam espaço para novas construções. Entretanto, suas instalações, em nenhum momento foi cogitada para se tornar um patrimônio cultural. A Figura 3 mostra as propriedades e fábricas Matarazzo.


[Figura 3]: Propriedades e Fábricas Matarazzo 

CONSIDERAÇÕES

Diante do exposto, percebemos o quão rica é a história da cidade de São Paulo, assim como é nítida a falta de propostas efetivas de reutilização dos espaços antigos da cidade. Atualmente, é necessário textos como estes para apresentar um breve esboço histórico sobre uma família e seu legado, no entanto, essa memória poderia ser preservada por meio da própria arquitetura presente no patrimônio histórico. Além disso, seria também objeto de estudo aos novos pesquisadores:

De fato, o lugar dos antiquários é tomado pelos recém chegados ao mundo do saber, que são os historiadores da arte. Para eles, as criações da arquitetura antiga doravante serão objeto de uma pesquisa sistemática relativa a sua cronologia, técnica, morfologia, gênese e fontes, sua decoração constituída de afrescos, esculturas e vitrais, assim como sua iconografia. (CHOAY, 2006, p.129).

Evidentemente, não é possível e nem seria viável a preservação total de todos imóveis históricos das famílias tradicionais de São Paulo, mas sem dúvida, a mansão Matarazzo seria suficientemente digna de um memorial e de sua transformação em patrimônio histórico. Assim, seria possível ser ela fonte de história, cultura e lazer:

Por sua vez, os monumentos e o patrimônio histórico adquirem dupla fundação – obras que propiciam saber e prazer, postas à disposição de todos; mas também produtos culturais, fabricados, empacotados e distribuídos para serem consumidos. (CHOAY, 2006, p.211).

Evidentemente, não podemos negar o caráter especulativo financeiro sobre esta propriedade, afinal a avenida Paulista é, atualmente, o metro quadrado mais valioso do país, no entanto, se anula diante disso, o valor simbólico desta mansão e sua potencialidade para se tornar um grande de centro público para gerações futuras.

REFERÊNCIAS

CHOAY, Françoise. A Alegoria do patrimônio. São Paulo: Unesp, 2006.

ZUCCONI, Guido. A cidade do século XIX. São Paulo: Perspectiva, 2016.

SECCHI, Bernardo. Primeira Lição de Urbanismo. São Paulo: Perspectiva, 2006.


FIGURAS

[FIGURA 1]
Fonte: desconhecido, acervo online google.

[FIGURA 2]
Fonte: http://acervo.estadao.com

[FIGURA 3]
Fonte: http://acervo.estadao.com
















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